Para conseguir 2º título, pré-candidato do PMDB a prefeito de SP usou em 97 tese apresentada por ele mesmo 3 anos antes PUC-SP diz não ver irregularidade
Chalita contesta autoplágio; prática é incomum e considerada antiética
Ex-secretário estadual da Educação e pré-candidato a prefeito de São Paulo, o deputado Gabriel Chalita (PMDB) usou teses praticamente idênticas para concluir dois mestrados, um em ciências sociais e outro em direito.
O caso é um exemplo típico de autoplágio, conduta rara e considerada antiética no ambiente acadêmico.
O primeiro mestrado de Chalita, em ciências sociais, foi defendido em 1994. Três anos depois, ele obteve o título de mestre em direito.
Cerca de 75% da segunda tese é uma reprodução da primeira. Os dois capítulos principais, além da conclusão do trabalho, são idênticos.
“O fato é inusitado. Nunca tinha visto caso idêntico ou similar a este”, afirma André Ramos Tavares, pró-reitor de pós-graduação da PUC-SP, instituição responsável por conceder os dois títulos de mestre a Chalita.
Entretanto, Tavares informou que a universidade não vê irregularidade no caso.
Há cursos da própria PUC, porém, que preveem que a identificação do autoplágio deverá levar “à imediata reprovação do aluno”.
A Folha procurou seis professores titulares de quatro universidades diferentes e perguntou se, em tese, aprovariam um aluno que defendesse uma segunda dissertação de mestrado nas mesmas condições de Chalita.
Todos disseram que não, e alguns afirmaram, sem citar o caso concreto, que seria possível pensar na revogação do título acadêmico.
“É evidente que um mestrado assim não vale”, diz Lenio Streck, consultor “ad hoc” de avaliação da Capes (órgão do Ministério da Educação responsável pelos cursos de pós-graduação).
“O aluno precisa apresentar o resultado de sua pesquisa. Se o trabalho é igual, o que ele pesquisou?”, questiona Streck, professor da Unisinos (Universidade do Vale do Rio dos Sinos, RS).
ORIENTAÇÃO
Procurado, Chalita afirmou, por meio de sua assessoria, que a sugestão de aproveitar no mestrado em direito o trabalho apresentado anos antes veio de seu orientador, o hoje desembargador Luiz Antonio Rizzatto Nunes.
“Trabalho idêntico não poderia ser”, afirma Nunes, que diz não se lembrar muito bem da orientação a Chalita. “Não tenho como fazer a avaliação em abstrato. (…) Desse jeito que você está falando eu não lembro, não faço ideia.”
Pela regras da PUC-SP, o aluno só pode obter o título de doutor em direito se já tiver um mestrado na área.
Ou seja, embora obtido pela mesma universidade, o mestrado em ciências sociais não poderia ser aproveitado.
Segundo sua assessoria, Chalita fez “algumas alterações” na primeira tese e incluiu “elementos da ciência do direito” na segunda.
As alterações feitas por Chalita não são evidentes. Lendo os dois trabalhos, é possível achar, por exemplo, a troca na posição de vírgulas e substituições de “esta” por “essa”, além de um ou outro parágrafo deslocado.
Já os acréscimos são mais claros. A bibliografia passou de 15 referências para 31, e o trabalhou ganhou dois capítulos -que foram largamente baseados no verbete “poder político” da “Enciclopédia Barsa” de 1977 e em citações de Shakespeare.
A conclusão dos trabalhos é idêntica, e o objetivo é o mesmo: discutir a questão do poder em Nicolau Maquiavel (1469-1527) e Étienne de La Boétie (1530-1563).
Os capítulos dedicados à análise dos pensadores também não foram modificados.
Em seu site, Chalita apresenta antes seu lado acadêmico e literário, e só depois a atuação política.
Além dos dois mestrados, ele tem dois doutorados, um em direito e outro em comunicação e semiótica, ambos pela PUC-SP, universidade da qual é professor desde 1997.
Segundo sua assessoria, a proliferação de títulos acadêmicos decorre de sua crença na “força da educação” e por ser essencial uma “aprendizagem constante e multidisciplinar” no magistério.
BANCA
A banca que aprovou o segundo mestrado de Chalita foi composta por Nelson Nery Junior e Celso Fiorillo, além de Nunes, o orientador.
Dos três, apenas Nery continua na PUC.
Nunes deixou a universidade e atualmente coordena o curso de pós-graduação da Universidade Metropolitana de Santos, instituição que foi recentemente descredenciada pela Capes e não consta da relação de cursos recomendados pelo MEC.
Fiorillo, que já foi diretor da faculdade de direito, deixou a PUC de forma litigiosa.
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